Cavaco, Portugal e a UE, ideias e mitos alimentados pela comunicação social.
Jornalismo

Cavaco, Portugal e a UE, ideias e mitos alimentados pela comunicação social.



Ui, ui… “o País” anda escandalizado com o discurso de Cavaco… diz que foi o “discurso da Ovibeja”. Enquanto uns não lhe perdoam a sugestão de trocarem os seus i-phones e as constantes visitas à fnac, por um estilo de vida mais frugal, mais “agrícola” (que gadgets serão necessários para plantar umas batatas?!...), outros acusam-no de hipocrisia por ter sido precisamente ele o “obreiro” do abandono das pescas e da agricultura.

Vamos ver, ciclicamente surge este tipo de reacção nos meios de comunicação social. Discurso aqui, intervenção acolá, e uma série de opiniões e de notícias, recuperam uma espécie de julgamento relativamente às opções tomadas a partir do final dos anos 80, nomeadamente, sobre o processo da adesão de Portugal à, então CEE, hoje União Europeia.

E aqui começam os mitos que a comunicação social é tão profícua em difundir … Por exemplo, se recordarem o tom das reportagens “em jeito” de retrospectiva que telejornais passam sobre o período da adesão à CEE existem dois ângulos distintos sobre a mesma realidade:

Mito 1: Quando a entrada na “CEE” é boa para Portugal: quando a reportagem pretende evocar, os benefícios da entrada na comunidade, incontornavelmente, Mário Soares é lembrado como sendo o obreiro da nossa entrada para a CEE.


Mito 2: A CEE obrigou-nos a destruir as pescas e a agricultura: este diagnóstico acompanha frequentemente as reportagens e notícias que se debruçam sobre o lado mau da entrada na “CEE”. Neste contexto, diversos opinadores, jornalistas, etc., esquecem completamente o papel determinante do eterno líder socialista (então não foi ele quem negociou os termos da nossa adesão?) e, quando se fala do definhar da agricultura, das pescas e restantes sectores “tradicionais”, apenas se associa o nome de Cavaco Silva.

Ainda sobre este 2º mito, nomeadamente, que a CEE nos forçou a não produzir, olhemos aqui para o lado… a Espanha, por ex., acabou com as pescas e a agricultura? Sabemos que não e também estão na UE, certo?
 
Ou seja, se a opção pelos subsídios para não produzir foi nossa e não imposta pela UE, quem foram então os culpados do desmantelamento da nossa economia?...

Pessoalmente, penso que Cavaco Silva, de facto, é um dos grandes responsáveis pelo declínio do modelo económico assente nos sectores mais tradicionais (agricultura, pesca, indústria, etc.), mas não nos moldes que muitos apregoam e a comunicação social, dá eco. Não foi publicado um decreto a estipular “abata-se!”. Não, o que provocou o definhamento dessas actividades económicas, foi a aposta centralista que o seu 2º mandato (principalmente) veio intensificar. A aposta - provinciana, diga-se – de querer desenvolver uma capital megalómana (à imagem de Paris, Madrid ou Londres), que iria depois “rebocar” o resto do País para o desenvolvimento. É desta visão que nascem o Centro Cultural de Belém, a sede da CGD, os planos da Expo 98, a Ponte Vasco da Gama, etc., etc…

Mas ver alguns sectores da sociedade portuguesa, nomeadamente, os socialistas, criticarem Cavaco Silva por isto, dá vontade de rir. Basta recordar que, que no início dos anos 90, ainda a A1 (Porto - Lisboa) não estava pronta, Portugal ainda era deficitário em escolas, centros de saúde, etc.,   e os socialistas indignavam-se contra a "política do betão" laranja. O PS - que governou de 1995 a 2002 e de 2005 a 2011 – o que fez para além de atapetar o país com asfalto?!

Também se mostraram muito indignados com o contrato (parcerias público-privada) da Vasco da Gama. O que fizeram a seguir? Assinaram 90% das PPP existentes... Será preciso dizer mais?

Foi essa orientação de todos os recursos para a criação de um Estado monstruoso (obra de Cavaco e Guterres, principalmente) e centralizado em Lisboa, do fomento - como aqui já referimos - de uma economia "pseudo-privada", que alimenta um sector de serviços baseado nos gabinetes de "grandes" advogados & seus pareceres, dos escritórios da banca e das consultoras internacionais, das administrações das empresas públicas e das ex-públicas (edp, pt, galp...), etc. … em detrimento de uma política de desenvolvimento mais equilibrada em termos regionais. 
Não tenho nada contra Lisboa, se a capital fosse no Porto, provavelmente aconteceria a mesma coisa, o problema é cultural, o problema é este modelo económico, em que decisões que afectam a vida de quem habita em Aljesur ou em Mirandela, dependem mais de um qualquer gabinete de um ministério em Lisboa, do que daqueles que conhecem o terreno. O resultado está à vista: Portugal é dos países mais desiguais da OCDE.
 
Um País onde, por exemplo, de acordo com dados do INE, na comparação entre regiões (NUTS III,) a região da Grande Lisboa revela um PIB per capita superior à média do país em mais de 60%! E onde, segundo o mesmo estudo, um cidadão residente na capital mais do que triplica o valor do mesmo indicador relativamente a um compatriota da região do Tâmega.
 
 
Quando, nas décadas recentes, o Estado colocou todos os recursos e incentivos, ao serviço de um modelo centralizado, “secou” tudo o resto. Os agentes económicos limitaram-se a seguir o rasto do dinheiro…

Querem encontrar o "culpado pelo fim" da agricultura e das pescas? Aí o têm - o Centralismo. Este foi (é) o grande erro de Portugal depois do 25 de Abril, está para lá de esquerda e direita, psd e ps...







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