Jornalismo
Quais são, afinal, os limites de tolerância do nosso jornalismo com aqueles que violam os valores da liberdade de expressão e imprensa?
Seremos um país de “Charlies” convictos? E, mais concretamente, será a nossa classe jornalística – olhando à forma militante como aderiu ao slogan “Je suis Charlie” nos últimos dias – uma defensora implacável e intransigente, contra TODOS aqueles que ameaçam os valores da “liberdade de expressão” e da “liberdade de imprensa”?...
Talvez uma resposta a esta questão possa ser encontrada recordando esta entrevista de Octávio Ribeiro ao jornal SOL e que foi objeto deste post de Março de 2013:
"Daria um excelente "Escândalo!", se fosse para malhar na Direita....
A entrevista, dada por Octávio Ribeiro (OR) na última edição do jornal SOL, pode ser lida aqui e traz novos elementos sobre as relações de Sócrates com o mundo da comunicação social.
«...[OR] Quando começo a ter acesso a algumas das escutas do Face Oculta apercebo-me que não era só a TVI que ia ser comprada. O CM também. Houve uma fase negra em Portugal em que, com o apoio da banca, se ponderou fazer grandes negócios na comunicação social que não visavam o objecto de negócio, mas sim mudar direcções e silenciar.
[Sol]O que pensa de Sócrates?
Entre 90 e 91, ao fim-de-semana tinha RTP e durante a semana Semanário e RR. Nesta altura, António Guterres apresenta-me uma jovem promessa. E, de facto, ele tinha um estar que contrastava: não usava gravata, dizia palavrões, era pouco mais velho do que eu e trabalhava imenso. Já como líder do PS faço-lhe a entrevista que antecede a queda de Santana Lopes, com o título: 'O PS está pronto para governar'. Logo a seguir dá-se a decisão de Sampaio. Numa primeira fase conversávamos muito, trocávamos impressões de forma aberta, ainda eu era director-adjunto.
Em 2007 ele faz-me um convite que achei que o primeiro-ministro não podia fazer.
Que convite foi esse?
Para substituir o José Eduardo Moniz na TVI. Ele diz que não sabia de nada do que se estava a passar, mas em Fevereiro fez-me esse convite. Quatro meses antes. Disse-lhe que não estava disponível e a relação acabou.
Sócrates quis dominar a comunicação social?
Completamente. Tinha essa vertigem. Denunciei isso muitas vezes em editoriais. Uma vergonha. Não é um democrata. É um tipo colérico quando é contrariado. Depois desse almoço na Travessa - e uma coisa estranha é que o restaurante estava cheio, mas todas as mesas à nossa volta estavam vazias, portanto presumo que ele não marcava apenas uma mesa, mas um quadrado -, acho que nunca mais falámos.» "
Ora, perante o conteúdo desta entrevista, qual foi a reação de todos os “Charlies” que agora povoam os jornais, as televisões e as rádios? A reação foi… ZERO.
Alguém se recorda, há altura dos factos - isto é, há altura em que um governo andava a silenciar tudo o que era órgão de informação que não controlava -, de algum movimento na comunicação social a denunciar aqueles que estavam a colocar em causa a “liberdade de expressão”?
Porque não existiu reação, porque não existiu indignação? Como pode explicar-se, sendo genuína e convicta esta posição de defesa intransigente da liberdade de expressão e imprensa, o total silencio dos que agora se afirmam “Charlies”?
Teria a ausência de reação ficado a dever-se à circunstância de tais manobras partirem de um governo “de esquerda”? O facto de essas pressões terem partido de uma personagem política, pela qual (ainda hoje, diga-se…) muitos jornalistas e comentadores nutrem uma admiração especial, terá ditado o encobrimento e esquecimento do caso, por receio do impacto que o mesmo poderia ter na opinião pública, nomeadamente, pela influência que poderia ter nas legislativas de 2009?
Enfim, por cá, a defesa da liberdade expressão e de imprensa, até pode ser importante. Mas, por favor, não venham dizer que é um “valor absoluto”. As evidências que outras causas se lhes podem sobrepor, está à vista de todos...
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