Jornalismo
Vida e vida severina
Quem costuma andar de ônibus em nossa capital sentiu, nos últimos dias, algo diferente naqueles vendedores que constantemente entram nos coletivos para vender os mais variados tipos de guloseimas.
É que estes trabalhadores ambulantes conhecidos como baleiros agora estão organizados em um sindicato, e desfilam pelos busus de Salvador vestindo os coletes de sua associação, a União dos Baleiros do Estado da Bahia-Unibal.
Como a equipe de Seis Elefantes não deixa passar nada, fomos às ruas conhecer um pouco mais a realidade e o trabalho bastante suado e digno destes verdadeiros operários.
O resultado desta peregrinação foi conhecer o baleiro Didi Carlão *, de 41 anos. Confira abaixo o bate-papo desta semana:
*Nome fictício para proteger a fonte
SE: Como de praxe em nossas entrevistas, fale um pouco sobre a sua infância...
Didi Carlão: Eu nasci em Conceição do Coité, interior da Bahia, onde os coronéis exploram os trabalhadores que trabalham com o sisal. Moro em Salvador há mais de 30 anos.
SE: Com qual idade você começou a trabalhar como baleiro?
DC: Desde os 20 anos de idade, na verdade sempre fui baleiro, foi meu primeiro e único emprego. Sempre vendi doces nos ônibus.
SE: Quantos baleiros atualmente estão cadastrados na Unibal?
DC: Hoje em dia, numa faixa de 1.500 baleiros.
SE: Em sua opinião, o que você acha que mudou com esta organização dos baleiros em um sindicato?
DC: Como o desemprego é muito grande aqui na cidade, sempre teve e sempre haverá baleiros, mas acho que hoje em dia tem mais organização. Antes, qualquer vagabundo, usuário de drogas se dizia baleiro para se aproveitar e entrava nos ônibus somente para passear. Acho que hoje em dia melhorou um pouquinho.
SE: Quais são as principais dificuldades enfrentadas pelos baleiros hoje em dia?
DC: A concorrência tá muito grande. Muita gente tá virando baleiro, e as vezes nós entramos nos ônibus e não conseguimos vender um chiclete. Acho que também a gente precisa se unir mais,tem muita briga entre a gente. Ontem mesmo eu quase brigava com um colega.... Porque o baleiro só pode andar 50 metros dentro de um ônibus, é entrar e sair pra dar lugar a outro colega. E só pode ter um baleiro por ônibus. E tem baleiro que acaba não respeitando isso. Sem contar que o nosso material está muito caro também.
SE: Quanto custa o material?
DC: Uma caixa completa com paçoca, cocada e quebra-queixo, com 50 de cada um, sai por mais ou menos R$ 11,00. O bom pra levar os doces são aqueles baldes, que não atrapalham os passageiros nos ônibus. Ali custa uns 15 paus.
SE: Quanto de dinheiro dá para tirar em um dia?
DC: Tirando a compra do material, sobra uns dez conto todo dia. Mas tem dia que vende mais e em outros também não conseguimos vender quase nada. Em época de chuva o povo compra mais, não sei porquê.
SE: Que horas você sai pra trabalhar? E que horas você volta pra casa?
DC: Todo dia, eu trabalho de 7 da manhã até 8 da noite.
SE: É difícil trabalhar como baleiro?
DC: Nós trabalhamos duro, tem de ter muita dedicação pra trabalhar como baleiro. Ficamos o dia todo na rua, só vejo minha família de noite, tenho medo de faltar comida pra eles.
SE: O que a Unibal exige para o baleiro se cadastrar?
DC: Só exige identidade e foto. Acho que deveria exigir também antecedentes criminais.
SE: Eu soube que o cadastro de novos baleiros está suspenso. Porque?
DC: Foi suspenso porque senão a concorrência iria aumentar muito.
SE: Teve eleição para escolher o presidente do sindicato de vocês?
DC: Teve nada. Tá uma máfia retada isso aí.
SE: Como assim?
DC: Eu não quero falar sobre isso não, o presidente é crente, da Universal...
SE: O que ele está aprontando?
DC: Esta entrevista vai sair em que jornal? De qual faculdade você é mesmo? Vou reunir o pessoal para fazer uma manifestação.
SE: Mas o que o presidente de vocês anda fazendo?
DC: Eu não vou dizer o nome dele, mas ele cobrou 10 conto de cada baleiro dizendo que era pra fazer os nossos coletes e ficou com o nosso dinheiro, porque na verdade o SETPS (Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros de Salvador) deu os coletes de graça. E algumas empresas também deu balas e doces pra ele repassar pra gente e ele também não repassou. Mas eu não quero falar agora não. Ele disse que é crente, mas está querendo roubar a gente. Vou falar com os outros colegas pra gente protestar contra isso.
SE: Depois que vocês passaram a usar os coletes do sindicato, os motoristas dos ônibus melhoraram o tratamento com vocês?
DC: Melhorou, a educação deles melhorou muito, nunca mais eles barrou a gente. Eu entro no ônibus, dou bom dia a eles, eles ficam de prosa com a gente depois.
SE: Você tem alguma coisa a falar que eu não perguntei?
DC: Este jornal aí vai pagar pra gente pela entrevista?
SE: (Risos) Paga nada. Qual o recado que você deixa para os estudantes que vão ler depois a sua entrevista?
DC: Digo para eles se dedicarem mesmo. Às vezes eu tento ler um livro, mas sempre não termino. Eu nunca tive tempo de estudar, sempre chego em casa cansado, o trabalho é muito puxado, a gente anda muito, eu tento dar uma vida melhor para os meus filhos.
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